Centro de Apoio à Pessoa em Luto

quarta-feira, 22 de abril de 2009

O fardo do silêncio


Se consigo estar em silêncio, é porque estou bem comigo mesmo, senão é porque estou preocupado, ansioso ou os fantasmas internos que me habitam, não me deixam descansar.
Estar em silêncio é também um exercicio de entendimento que fazemos com os outros, com o mundo e com o nosso prórprio ser.


É através do silêncio que percorremos as interrogações do mundo relacional e emocional que nos habita e nos faz ser quem somos.
É atravès do silêncio, que guardamos em nós, os nossos momentos significativos, para mais tarde recordar, e é com esse mesmo silêncio que encerramos em nós mesmos, o verdadeiro significado que nós damos à maneira como vivemos e experiênciamos todos os sentimentos e emoções.


Guardamos no silêncio do nosso ser e da nossa existência o significado e a essência significante.
Desde que te perdi, nunca mais ouvi, com o mesmo significado aquela palavra que tanto gostava de ouvir; desde que te perdi, nunca mais senti com o mesmo significado o mesmo passeio que faziamos; desde que te perdi, nunca mais fui ao nosso sitio especial, pois ele sem ti nunca mais será o mesmo.


Desde que te perdi, encerrei no silêncio do meu interior este sofrimento inerente ao nosso significado e aos nossos momentos, comportamentos, sitios e objectos significantes.
Desde que te perdi que me encerrei em mim mesmo para te tentar encontrar e vivermos como viviamos.Desde que te perdi, perdi-me a mim mesmo, e é no silêncio do nosso interior que sofremos a perda.

Nesse silêncio que só o nosso ser entende e necessita, e é nesse tempo de silêncio que emergem todos os sentimentos que não me sinto com vontade de explicar a ninguém, pois o que eu sinto, só no meu silêncio sofro e entendo, e somente num silêncio partilhado conseguirei exorcizar essa dor.

Não quero que ninguém me explique nada, e muito menos tenho vontade de explicar ou de me justificar a alguém, este sofrimento que sinto, e que encheu a parte vazia de mim; está agora a tomar conta do meu ser; e aqui está o verdadeiro perigo; pois se esse sofrimento tomar conta de todo o meu ser, eu simplesmente deixo de existir, e se eu deixo de existir o outro que habita em mim também deixará de existir.

Por isso com muita ternura, respeito, confiança, e sobretudo muito amor, que aprendemos a sofrer e a guardar esse sofrimento numa parte de nós. Ao lado desse sofrimento guardamos os significados únicos que aprendemos a construir com essa pessoa, e mesmo ao lado estão todas as nossas recordações, boas e más, pois até essas são importantes.

É nessa altura que levantamos a cabeça, “erguemos” a voz, limpamos o lago de lágrimas interno, e dizemos para nós próprios que esse sofrimento não vai crescer mais que eu mesmo, que esse sofrimento não vai sugar a vontade de viver, que esse sofrimento não vai tirar o significado que eu dou às coisas, que esse sofrimento não me vai impedir de sonhar, que esse sofrimento não me vai impedir de ser novamente feliz, que esse sofrimento não me vai impedir de voltar a sofrer, que esse sofrimento não me vai impedir de viver.


Estou vivo e sofri, porque tive a coragem de amar e de libertar quem teve de ir...nesse momento libertei-me a mim mesmo do sofrimento e guardei-te bem dentro do silêncio do meu ser para todo o sempre e sem nunca te esquecer.

“O homem só pode se encontrar, perdendo-se” (Sartre)

2 comentários:

Natacha Evangelista disse...

Bom dia meu GRANDE amigo! Mais uma vez não me surpreendes-te, pois tu sabes bem o que fazes!!!PARABENS!

Ana Diogo disse...

Palavras que nos tocam vindo de ti amigo... palavras sábias, palavras e sentimentos de quem vive. ama e não esquece, porque não tem de esquecer... beijo grande e parabéns pelo teu excelente trabalho e pela pessoa que és... Tixa