Centro de Apoio à Pessoa em Luto

domingo, 19 de julho de 2009

O tempo que temos


Mesmo que tivessemos todo o tempo do mundo; isso não seria suficiente para nos amarmos na medida do nosso amor.

Mesmo que tivessemos todo o tempo do mundo; não conseguiriamos beijar todos os beijos que desejamos dar; todos os mimos que queriamos trocar, todas as palavras que gostavamos de partilhar, todos os sonhos que queriamos realizar e todas as vidas que gostariamos de experimentar...

Mesmo que tivessemos todo o tempo do mundo; não seria suficiente para estarmos em silêncio um com o outro, para ouvirmos os segredos mais profundos do nosso ser, para espiarmos a culpa que até temos nas discussões que tivemos, para reconstruir um nós sem defeitos, enfim para sermos eternamente perfeitos e felizes.

Mesmo que tivessemos todo o tempo do mundo; não seria possível fintar a vida e a morte, não seria possível sermos únicamente nós, sem nenhum dos outros, não seria possível renegarmos o bom e o mal e vivermos únicamente num mundo ambigúo e sem a paixão dos sentimentos.

Mesmo que tivessemos todo o tempo do mundo; e já não temos; não conseguiriamos fugir à realidade, que tudo o que tem um início tem também um fim....E como não tivemos todo o tempo do mundo, conseguimos realmente amarmo-nos cada um a nossa maneira, com as nossas imperfeições, erros, angústias, discussões, lágrimas, beijos, caricias, abraços, palavras genuínas de amor, e é claro muita paixão, compreensão, empatia, mas principalmente, partilha.....

Partilhar o dia de trabalho, os gostos que cada um têm, as pequenas manias, as nossas tristezas, as palavras vazias, os sonhos e pesadelos, as grandes histórias que passaram na vida de cada um de nós, as pequenas fantasias, o nosso corpo, a nossa memória, enfim a nossa própria história.... E como não tivemos todo o tempo do mundo, vivemos intensamente o tempo que estivemos um com o outro, e vivemos um para o outro, e vivemos com paixão, com sentimentos exuberantes.... E como sabiamos que não iamos ter todo o tempo do mundo, construímos um projecto para o tempo que não sabiamos que tinhamos, construímos um castelo de areia para os nossos sonhos e uma muralha de barro para o nosso amor.... E como sabiamos que não tinhamos todo o tempo do mundo aproveitamos o tempo que tivemos.... E como sabiamos que não tinhamos todo o tempo do mundo, fingimos que até tinhamos, para vivermos na ilusão da eternidade impossível.

É disso mesmo que tenho saudades; da partilha, de ter-te a meu lado, de não ser perciso abrir a boca e mesmo assim tu entenderes o que eu digo entre o silêncio cúmplice dos apaixonados....

É disso mesmo que tenho saudades; das palavras que trocamos, dos segredos que ouvimos, das noites que não dormimos, das madrugadas acordadas ao toque dos mimos.
É disso mesmo que tenho saudades, de um outro diferente de mim, mas que faz parte de mim mesmo....

É disso mesmo que tenho saudades, de um outro diferente de mim, mas que faz de nós um todo em harmonia....

É disso mesmo que tenho saudades, simplesmente de ter-te a meu lado...

Ainda bem que não tivemos todo o tempo do mundo, pois amamo-nos à nossa medida.

Ainda bem que não tivemos todo o tempo do mundo, pois no tempo que tivemos completaste-me inteiramente todo o meu ser e a minha essência.

Ainda bem que não tivemos todo o tempo do mundo, pois se tivessemos, nós não seriamos nós, mas mais um pedaço da eternidade.

sábado, 11 de julho de 2009

A Viagem


A viagem

Se puder, gostaria de me levar,
gostaria ainda de levar comigo
todos os sentimentos,
alegrias e tristezas,
amores e belezas.
Todas elas são bem vindas
pois são sentimentos.
Gostaria de levar todas as cores
todos os pássaros
todos os peixes do mar
e pelo menos gostaria de levar,
o som de uma andorinha a cantar.
Mas também levava; música ,
e numa caixa feita de algodão um pouco de silêncio
para tentar recordar.
Há, já me ia esquecendo,
tinha que levar as minhas recordações,
todas elas,
sem qualquer distinção.
Todas elas cabiam numa grande arca.
Numa caixa de fósforo,
levava a minha beleza.
Numa caixa de cartão
levava as minhas ambições,
numa caixa de barro
levava o meu coração,
e numa caixa;
numa grande caixa de ferro
levava todos os meus sonhos.
O meu saber é pouco,
mas gostava de o conservar
como uma árvore.
Mas nesta viajem
teria também que levar
o mar e as estrelas,
teria que convencer a lua a me acompanhar,
e teria que levar o sol acorrentado.
Teria que levar os quadros amarrados.
É claro que é pouco provável conseguir transportar tudo,
mas se tiver de optar
por alguma delas,
prefiro lutar por todas.
Mas se afinal a viagem é tão importante
e o preço é tão alto,
então é justo eu conseguir levar tudo o que quero;
e afinal o que eu quero
é tão pouco;
ou será muito...?

Minhas amigas e amigos, decidi partilhar este meu poema com todos. Escrevi-o tinha 17 ou 18 anos mais ou menos não sei percisar bem. Nesta altura pensava muito nesta viagem, em como ela seria, o que iria vêr e sentir quando chegasse ao destino, em todas as coisas magnificas ou horriveis que poderia encontrar, pensava em todo o manto escuro que cobre de mistério esta viagem final.....Pensava, e umas vezes ria, outras chorava, mas a maior parte das vezes recordava os que tinham passado pela minha vida e me tinham marcado, pensava nas pessoas que estão na minha vida e fazem parte de mim, e pensava sobretudo em ti, que ainda nao te tinha descoberto nessa altura mas que já sabia da tua existência.

Entretanto fui crescendo, fui errando muito, fui apreendo aos poucos, fui vivendo sem rumo, até que te conheci. Nesta altura a vida passou a ter um rumo, o meu coração passou a ter uma companheira, o meu sorriso passou a ter um beijo e o meu abraço passou a ter um corpo.

Deixei de pensar nessa viagem magnificamente aterradora e misteriosa e passei a pensar em nós. Deixei de ter medo de morrer e passei a querer viver eternamente, deixei de sonhar para viver esse sonho contigo, deixei de me amar, para te amar completamente e o mais genuínamente possivel.

Foi neste momento que pensei que eramos imortais, que iriamos viver uma felicidade perpetuada nos momentos mágicos que construimos, numa certeza ilusória que a vida é magnificamente bela e sem dor. Foi exactamente neste momento de exaltação que o sonho morreu e a realidade apareceu!

Decidiste fazer essa viagem (ou alguém ou algo te conveceu a viajar ainda estou para saber) final, sem um adeus ou um até logo ou mesmo um até sempre....foste-te embora tal como chegaste; através das impermanências desta vida....

Voaste para longe, e eu não sei voar; partiste numa viagem onde não te posso acompanhar; chegaste a um destino onde nem sequer consigo imaginar.

Mas a realidade é que te foste embora, partiste nessa viagem final; simplesmente espero que tenhas feito uma boa viagem, simplesmente espero que tenhas encontrado o que desejasses e o que mereces, simplesmente espero que sejas feliz, simplesmente espero que esperes por mim da forma mais genuína de se esperar, que é no meu entender não esperando.

Boa viagem.....

quinta-feira, 2 de julho de 2009

Formas simples de ajudar a lidar com o sofrimento e a perda


Existem formas simples de ajudar alguém em processo de luto, formas ao alcance de cada um de nós. Exemplos dessas ajudas são:

1. No início, a pessoa que vivencia a perda pode precisar de ajuda nas decisões mais simples. Pode apreciar a ajuda prática (ajuda em burocracias, preparação de refeições...).

2. Ser sensível às diferenças culturais e religiosas e procurar informação sobre costumes, rituais e práticas de modo a apoiar a pessoa (legitimar o que a pessoa está a sentir).

3. Dar a conhecer à pessoa que se está preparado para aceitar aquilo que a pessoa quiser partilhar connosco: as suas lágrimas, memórias, a sua raiva. Não brincar com a pessoa. Um ouvinte apoiante é o que elas precisam.

4. Ajudar a pessoa a perceber as tarefas/fortmas de coping (de lidar) com a perda de modo a que elas possam entender aquilo que se passa com elas.

5. Estar constantemente atento sobre o significado da perda para a pessoa nesta altura (e.g. uma pessoa que se divorcia, cujos filhos saem de casa e que depois perde o cão pode ficar profundamente deprimida pela última perda significar o elo final da cadeia de perdas).

Tarefas de coping no luto

Tarefa 1: Aceitar a perda como algo real
As pessoas tendem a oscilar entre a negação e a aceitação. A aceitação pode ser mais difícil em situações como o divórcio em que existe a possibilidade da pessoa regressar. É um período frequentemente descrito como "irreal" e em que a pessoa que vivencia a perda se sente desligada de tudo e esmagada pelo sofrimento.

Tarefa 2: Vivenciar a dor do desconsolo/sofrimento

Esta tarefa está associada com um tempo de sentimentos extremos misturados. Para a maioria das pessoas, os sentimentos regressam rapidamente após a perda e podem sentir dor física intensa, frequentemente descrita como estando no cerne do estômago ou à volta do coração. Isto é frequentemente acompanhado por uma saudade intensa e procura da pessoa. Visitar locais associados a essa pessoa, chamar o seu nome e chorar fazem parte da saudade. A pessoa pode também sentir que está a ficar "maluca" com a intensidade da emoção. Com a aceitação da perda pode vir a raiva - pela pessoa que morreu, raiva consigo próprio, com Deus,... Pode ainda sentir-se tensa e irritável, ou vivenciar sentimentos de ansiedade e culpa.

Tarefa 3: Ajustar-se à vida sem a pessoa

Antes da pessoa que vivencia a perda ser capaz de começar a adaptar-se, entra num período alternado com a segunda tarefa, em que tudo parece vazio e supérfulo. Tem falta de interesse por tudo e por vezes deseja morrer. Eventualmente, a pessoa começa a descobrir novos modos de coping, novos padrões e objectivos de vida. Isto é visível em comportamentos que mostram que estão preparadas para prosseguir em frente, como tirar férias, recordar o apartamento, alterar a aparência física, ter um novo passatempo...

Tarefa 4: Aceitar a perda

Quando a pessoa aceita a perda, está então pronta para vivê-la novamente, e para fazer novas relações, aceitar novos desafios. O passado e os entes queridos são ainda lembrados e estimados pela pessoa mas estes sentimentos já não impedem a pessoa de apreciar a vida quando os sente!